A
lei 8112 de 11 de dezembro de 1990, dispõe
sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias
e das fundações públicas federais. Há uma tendência jurisprudencial em considerar o servidor público como sendo aquele que detém um cargo público, contudo, o
professor Rigolin tem adotado um conceito
amplo de servidor público: “Servidor
público sempre foi, é sem dúvida
alguma, e ao que tudo faz crer para sempre será,
o cidadão vinculado por algum regime
de trabalho à Administração pública, seja qual for esse regime, e, dentro dele,
seja qual for a natureza — permanente ou em confiança — daquela vinculação.”
(Rigolin, Ivan Barbosa. Comentários ao
regime único dos servidores públicos civis. 7 ed. rev. E atual. São Paulo :
Saraiva, 2012 - ebook). (grife-se). A
Lei 8112/90, em tese, se aplica tão somente aos servidores públicos
estatutários federais. Mas, na hipótese do ente público municipal ou estadual não possuir regramento para determinadas matéria, poderia usar
subsidiariamente o diploma federal?
Nossos Tribunais enfrentaram alguma situações:
a) Remoção de Servidores não
prevista no Estatuto Estadual:
“ [...]I - A remoção por motivo de saúde do
servidor, de seu cônjuge ou companheiro ou de dependente, apesar de não
encontrar regulamentação expressa na Lei Estadual no 6.107/94 (Estatuto dos
Servidores Estaduais), é direito que pode ser exercido no serviço público
estadual, por aplicação analógica da Lei no 8.112/90 (Regime Jurídico dos
Servidores Públicos da União). Precedente desta Corte(MS 28.686/08). [...]Dessa
forma, inexistindo norma no âmbito
estadual para disciplinar a remoção dos servidores, cabe, por analogia, a
aplicação da Lei 8.112/1990. MINISTRO HERMAN BENJAMIN Relator (STJ - REsp:
1233201 , Relator: Ministro HERMAN
BENJAMIN, Data de Publicação: DJ 25/02/2011).(grife-se)
B) Férias
Proporcionais não previstas em Estatuto:
STF - Inq.
2577/BA - Min. MENEZES DIREITO JULGAMENTO: 05/06/2008 “Nesse sentido é a
jurisprudência dos tribunais pátrios: 'ADMINISTRATIVO. SERVIDOR COMISSIONADO.
FÉRIAS. PAGAMENTO PROPORCIONAL. 1. Ao servidor exonerado do cargo em comissão é
devido o pagamento relativo a férias proporcionais. 2. Servidor que ocupou
cargo em comissão entre 13/01/93 e 26/09/95, e que gozou somente dois meses de
férias, faz jus à indenização de 9/12 da remuneração, a título de férias
proporcionais. 3. Apelação e remessa oficial improvidas. (TRF 1 - AC
1999.01.00. 085143- 1/DF, Rel. Juiz Federal Flávio Dino de Castro E Cos
ta (conv),
Segunda Turma Suplementar, DJ de 17/03/2005, p.59) SERVIDOR PÚBLICO EXONERADO.
Férias integrais e proporcionais em pecúnia e décimo terceiro salário proporcional.
Previsão em lei municipal somente para a
hipótese de exoneração voluntária. Irrelevância. Aplicação a todas as
hipóteses de exoneração porque o direito decorre das correspondentes garantias
constitucionais. Recurso provido para julgar procedente a demanda. (TJSP –
A pelação com Revisão 2524075000, Rel. Desembargador Edson Ferreira, 12ª Câmara
de Direito Público, Publicado em 29/11/2007) ADMINISTRATIVO - AÇÃO DE COBRANÇA.
SERVIDOR - CARGO COMISSIONADO - EXONERAÇÃO - VERBAS RESCISÓRIAS - 13º SALÁRIO E
FÉRIAS –[...]
O Tribunal
Regional do Trabalho da 14ª Região:
“JUIZ FEDERAL DO TRABALHO. EXONERAÇÃO. FÉRIAS PROPORCIONAIS.
INDENIZAÇÃO. PERÍODO AQUISITIVO INCOMPLETO. AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI Nº 8.112/90. (TRT 14ª Região - Processo n°
0000150-83.2011.5.14.0000 – Rel.: DESEMBARGADOR VULMAR DE ARAÚJO COÊLHO
JUNIOR).
Ainda:
REPRESENTAÇÃO
CONTRA MAGISTRADO - CONDUTA INCOMPATÍVEL COM O CARGO - PENA CABÍVEL DE ADVERTÊNCIA OU CENSURA - ARTIGO 439 DO
CÓDIGO DE DIVISÃO E ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIAS - APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO ESTATUTO DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS CIVIS DO
ESTADO (ART. 150, I) - DECURSO DO PRAZO DE DOIS ANOS A PARTIR DA PEÇA
INAUGURAL - PRESCRIÇÃO - ARQUIVAMENTO. (TJ-SC - RP: 26614 SC 2003.002661-4,
Relator: Alcides Aguiar, Data de Julgamento: 21/05/2003, Órgão Especial, Data
de Publicação: Representação n. 2003.002661-4, da Capital.)
O STJ tem reconhecido a aplicação subsidiária da
Lei n. 8.112/1990 aos servidores públicos estaduais, quando ausente: AgRg no
REsp 1.143.745/BA (transferência de servidor público), Rel. Ministro Luiz Fux,
Primeira Turma, DJe 17/12/2009; EDcl no RMS 18.203/AM (acumulação de cargos),
Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJ 13/02/2006; REsp 181.536/PB
(transferência de aluno), Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, Segunda Turma,
DJ 19/04/1999. E há aqueles em que se entendeu pela não aplicação; v.g.: RMS
10.365/PA (procedimento administrativo - servidor estadual), Rel. Min. Fernando
Gonçalves, Sexta Turma, DJ 28/8/00; REsp 780.278/PB (procedimento administrativo
- servidor municipal), Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ
06/08/2007, a matéria é controversa.
O Conselho Nacional de Justiça deliberou
pela aplicação subsidiária da Lei 8.112/90 e 9.784/99 para apuração de faltas
disciplinares perpetradas por juízes. Mas, atente-se que o Servidor será obrigado fazer ou deixará de fazer
alguma coisa, quando a lei assim dispuser, neste sentido, o inciso II, do
artigo 5º, da CF/88: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer
alguma coisa senão em virtude de lei;” A obrigação de fazer e não fazer
deve estar disposta em lei. Dispõe o artigo
5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal “não
há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;” Ilícito
penal não é Ilícito administrativo, mas há ilícitos penais que refletem da
administração. O peculato está no código penal (lei penal– sanção penal), mas
pode ocorrer que não esteja tipificado na legislação municipal (lei
administrativa/civil- sanção administrativa), estaria o servidor que cometeu o
peculato (que também é improbidade) protegido de receber a punição diante da omissão legislativa
municipal? O artigo art. 14 da Lei de improbidade administrativa,
a ser aplicada para todos os entes da
Federação, in verbis: “Qualquer
pessoa poderá representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigação
destinada a apurar a prática de ato de improbidade.” Aqui o legislador impõe que seja feita uma
sindicância investigativa. Entendo que na hipótese de omissão do legislador
municipal de lei punitiva, não caberia a pena mais grave, mas uma advertência e
ressarcimento ao erário público apurado em uma Sindicância Punitiva, que por ora,
cumprem com o dever de punir o infrator até que a lei a torne como causa de
demissão ou suspensão. Os defensores do direito comparado ao direito penal
defendem que não deva haver punição, embora não seja reconhecida a advertência
com uma “pena”, mas uma espécie de sanção sui
generis. A advertência é um aviso, gera reincidência, muda comportamentos
na administração, pois a Certidão Positiva de ilícitos Administrativos
constarão a advertência, impedindo a participação em concurso, progressão na
carreira ou promoção. Não há na CLT previsão para a advertência, mas a sua
possibilidade jurídica advém do costume. A argumentação de não aplicação da advertência
falece diante da ordem constitucional no artigo 37, “[...] administração
pública [...] obedecerá aos princípios de [...]moralidade[...].” Ainda, dispõe
o inciso II, §1º do artigo 41 da Constituição
Federal : “O servidor público estável só perderá o cargo: [...]II - mediante processo administrativo em que lhe seja
assegurada ampla defesa;” A previsão para um processo administrativo
disciplinar está previsto na Constituição Federal, devendo ser instaurada pelo
Gestor e assegurar ao servidor a ampla defesa.
A Carta
Constitucional de 1824, no art. 179, no 30, já estabelecia que "todo
cidadão poderá apresentar, por escrito, ao Poder Legislativo e ao Executivo,
reclamações, queixas, ou petições, e até expor infração da Constituição,
requerendo perante a competente autoridade a
efetiva responsabilidade aos infratores".
O tema é tormentoso, pois se a
administração não toma providências para a apuração, restará inviável a
responsabilização do agente, mas caberá a responsabilização do Gestor Público pela
inércia. Deve este, agir ante as exigências do Principio da Eficiência e da Boa
Administração. O Gestor deve primeiramente encaminhar ao legislativo, lei regulamentando
o processo disciplinar, atendidos os princípios estabelecidos na
Constituição Federal, em seguida, deve a abrir portaria ou decreto designando
uma comissão para apurar os fatos. Enquanto tramita a lei municipal ou
estadual, a comissão poderá aplicar subsidiariamente a
Lei 9784/99, que trata do processo administrativo no âmbito da Administração
Pública Federal. Encerrados os trabalhos, é realizado um relatório e enviado
para o Gestor Público, que realizará o julgamento. Como não há lei local
regulamentando o Processo Administrativo e o Julgamento, entendemos que nesta hipótese poderá
ser aplicado subsidiariamente a lei
federal conforme orientação do Art. 4º da Lei de Introdução às normas do
Direito Brasileiro “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. O processo administrativo disciplinar
tramitará de acordo com a Lei 9784/99 e
8112/90, sob o fundamento do Principio Constitucional da Moralidade, da Probidade Administrativa ,
da razoabilidade e da simetria, para
aplicar a todos servidores federais,
estaduais ou municipais, que de alguma forma forem desonestos com a coisa
pública.